quarta-feira, 25 de março de 2009

A Casa Perfeita - do livro "Para quererte mejor"

Jaime Barylko (*)

Arthur Clarke se volta para o futuro e imagina uma história do ano 2019, quando o homem estaria vivendo totalmente absorvido em um mundo de aparatos, autômatos, robôs e computadores.

Existe um personagem que se chama Arthur. Na realidade, não se trata de um ser humano, mas de uma casa. Sim, uma casa inteligente. Enfim, personagem, porque fala, dialoga, se comunica, atua, reage.

Pela manhã, Arthur abre as persianas, prepara o café, anuncia a temperatura, põe música clássica. Arthur, esta casa inteligente e perfeita, também faz a ambientação que o cliente desejar. Repentinamente o faz sentir ventos, calor, ou lua cheia. Gradua a temperatura a seu gosto, se quer dormir nu ou com três cobertores.

Samuel Palmerstone é o nome do habitante da casa. Na realidade, deveria ser dito, o amigo de Arthur. Afinal é o que são, amigos. Um pede, o outro lhe dá; um pergunta, o outro aconselha. Amigos. Um dia se conheceram e foram se amoldando um ao outro.

“A Arthur custou vários meses para conhecer Palmerstone e ajustar a programação da casa e seus estados de ânimo, rotinas, gostos e manias...”

Com o tempo, está claro, foram se conhecendo e cultivando a amizade que ocorre com a convivência. Arthur “também se encarregava de acompanhar seus negócios e tinha autorização para comprar ou vender os estoques da Palmerstone quando os preços ultrapassassem certos limiares”.

Porém nada é eterno. Ocorreu a fadiga. Palmerstone se cansou de tanta perfeição. Parece que a perfeição pode aborrecer e ser cansativa. De modo que Palmerstone um belo dia decidiu mudar-se deste bairro suburbano onde vivia sozinho e solicitou um posto de trabalho em plena Filadélfia.

“Isto lhe atraía muito. Aqui dezenas de profissionais, arquitetos, advogados, escritores, banqueiros e, inclusive um pintor, viviam sob o mesmo teto...”

Outro sistema de vida, enfim. Com gente, com outros seres humanos. Talvez menos perfeitos, mas algo mais emotivo. Claro que Arthur se inteirou de que seu amigo ia o abandonar. Ele o queria muito, ficou muito triste e não estava disposto a ficar sozinho. Sentia-se traído.

Haviam sido tão amigos e agora, de repente, unilateralmente, Palmerstone decide retirar-se e esquecê-lo. Arthur não podia suportar esta situação. Encheu-se de cólera e, uma noite, Palmerstone lhe pediu alguma coisa fresca, Arthur lhe deu, mas quando Palmerstone dormiu a casa continuou produzindo frio cada vez mais e assim foi como o encontraram no outro dia, morto, congelado.
(Continua na próxima postagem com texto complementar - Algo Mais Que Tecnologia)

(*) Jaime Barylko - filósofo e escritor, nasceu (1936) e morreu (dezembro,2002) em Buenos Aires. Doutor em Filosofia pela Universidade Nacional de La Plata. A maioria de seus livros tornaram-se bestsellers. Sua última obra foi publicada em 2002: Los Valores y Las Virtudes.

Nota:
Em 1997 quando me encontrava em Buenos Aires para a passagem de ano, assistia a um programa de TV quando anunciavam o lançamento do livro "Para quererte mejor - Ese difícil arte de Amar y ser feliz", de Jaime Baylko, que era o meu questionamento do momento, bem como o de minha amiga que viajava comigo. No dia seguinte saímos feitos loucas atrás de dois exemplares. Em 1998, por ocasião de um evento da Construção Civil - EMARCON, que promovia no Shopping Ponteio, contatei o escritor para fazer uma palestra. Concordou, mas no dia que deveria embarcar para Belo Horizonte, ele me telefonou dizendo que não poderia vir, pois o parto de sua nora grávida havia sido antecipado e, através de uma cesariana seu neto chegaria ao mundo e nada, nada mesmo o tiraria de perto de seu filho e dela para receber o novo membro da família. Quatro anos depois soube de seu falecimento, em 2002.

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